Já percebeu que nas redes sociais a vida é perfeita? O mundo online abre espaço para uma imagem que, em grande parte, não existe na vida real. Somos todos bonitos, bem-sucedidos, inteligentes, nos vestimos e comemos bem, somos felizes o tempo todo.
Não que as pessoas sejam 100% verdadeiras na vida real, assim como no “mundo virtual” tendemos a dizer algumas mentiras, afim de preservar as relações sociais. Mas o distanciamento oferecido quando se está “do outro lado do monitor”, encoraja as pessoas a realizarem ações que não realizariam off-line, a sensação é de que se está imune à descoberta da verdade.
Os motivos das mentiras podem variar e os psicólogos buscam estudar a inteligência maquiavélica utilizada por pessoas que simulam histórias e situações, combinando a expectativa das reações dos receptores com a preocupação em torná-las as mais verdadeiras possível.
Algumas mentiras são contadas de modo tão coerente, com tanta riqueza de detalhes, envolvendo emoção e proximidade com os sentimentos do receptor, que é quase impossível não acreditar nelas.
Neste texto não iremos fazer uma análise comportamental. Iremos apontar teorias e estudos sobre os motivos que levam as pessoas a mentir, discutindo as consequências, algumas sobre as quais recaem julgamentos e, principalmente, punições judiciais: os crimes.
Geralmente, mentir não é crime. É verdade que pode ser imoral e antiético, mas só é considerado um crime se causar danos ou perdas às partes. Outra possibilidade de ser considerado um crime é quando se ganha algo com a mentira.
Na internet, é comum nos deparar com três tipos de mentira: aquele que tenta impressionar alguém para ganhar respeito e admiração, e o mentiroso que tenta alcançar piedade, compaixão e empatia das pessoas para ter atenção e o mentiroso basicamente criminoso.
Pessoas que agem assim podem ser enquadradas em vários tipos de crime, dependendo do tipo, da motivação, intenção, dano ou perda causado ou da vantagem obtida.
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Quando mentir é crime – estelionato
De acordo com o código penal, o estelionato acontece quando alguém tenta “obter, para si ou para outro, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento” (Art. 171).
Quando dizemos que alguém é um estelionatário, você pode imaginar bandidos daqueles que só se vemos na tv. Porém, é mais comum do que se imagina, e vendo os exemplos será possível perceber isso:
- Fingir doença;
- Inventar que foi assaltado;
- Dizer teve a casa inundada para receber doações.
Em geral nestas situações, as pessoas se sensibilizam e sentem-se dispostas a colaborar, mesmo quando se deparam com essas situações na internet.
Essas artimanhas são utilizadas porque normalmente, apenas com um pedido de doação, o mentiroso não obteria sucesso. Por isso, apresenta-se em situação de dificuldade.
Quando não é crime: quando a mentira é contada sem a finalidade de obter vantagens. Por exemplo, quando se apresenta em uma vida muito difícil, fazendo uma cena dramática, mas não pede ou aceita ajudas, doações ou qualquer outro tipo de benefício ou vantagem que não seja a atenção de terceiros.
Também devemos considerar aqui o “estelionato emocional”. Trata-se de pessoas que foram vítimas de golpes virtuais relacionados a falsos namorados. São pessoas que se envolvem em um relacionamento que, mesmo à distância, leva a outra pessoa a prestar favores financeiros mediante estórias escabrosas.
São aquelas situações que comumente vemos nos noticiários.
Quando alguém se aproximar de você com pedidos de ajuda financeira, procure saber informações e provas da condição descrita pela pessoa.
Pessoas doentes possuem laudos médicos e exames que comprovam a necessidade específica, e costuma deixar isso público na internet. Se o caso é um assalto ou roubo, a pessoa deve apresentar boletins de ocorrência policial, as que passaram por tragédias naturais, causadas por chuvas e incêndios, podem mostrar as imagens e matérias jornalísticas que comprovem a situação.
Se você estiver buscando ajuda na internet e até mesmo fora dela, procure agir de maneira transparente e honesta, fornecendo o maior número possível de provas, além das citadas acima, providencie referências acessíveis para que as pessoas confirmem a veracidade da sua história.
Quando mentir é crime – falsidade ideológica
O Código Penal brasileiro explica que “omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante” (Art. 171).
São exemplos comuns:
- Falsificar o conteúdo de um documento que já existe (por exemplo, um laudo médico usado no crime de estelionato para “provar” que está doente e pedir doações);
- Criação de perfis “fakes”(falsos);
- Apropriar-se de informações, dados e imagens de outras pessoas como se fossem seus, mentir sobre si mesmo e sobre a sua condição.
Existem casos até mesmo de falsificação de testes e exames de gravidez e de boletins de ocorrência policial para justificar agressões e estupros.
Sobre falsificar documentos não há nem o que se falar, mas quanto à criação de perfis “fakes” há uma linha bem frágil sobre quando essas situações são crimes ou não, então, nestas situações, é preciso se perguntar se aquela pessoa está agindo com interesse em obter vantagem ou se ela está prejudicando a terceiros.
Se o perfil falso não for de alguém vivo e nem for utilizado para tirar vantagem ou provocar danos, não é crime de falsidade ideológica.
É possível que alguém queira criar um perfil usando um apelido e uma imagem abstrata apenas porque quer compartilhar notícias e interagir com as pessoas sem que seja rapidamente identificado, desde que não cause dano ou prejuízo.
Mas se ele cria o perfil falso com a intenção de prejudicar outra pessoa, debochando ou até mesmo ofendendo a terceiros, então ele está cometendo um crime.
Hoje em dia, algumas redes sociais possuem mecanismos que impedem a criação de perfis falsos. Nunca utilize imagens outras pessoas como se fossem suas. Ao usar imagens de personalidades vivas ou marcas pode ter que responder por mais crimes do que uso indevido da imagem.
Indique verdadeiramente qual é o seu gênero, sua idade ou seu estado civil. Quando você mente sobre estes aspectos da sua vida, pode gerar expectativas em terceiros que não correspondem à realidade e essas pessoas podem se sentir prejudicadas de alguma forma, principalmente emocionalmente.
Se você “pegar” alguém usando a sua imagem, o seu nome ou as suas informações, é preciso consultar um advogado, mas antes que isso aconteça, algumas medidas podem ser tomadas por você, afim de evitar cair num golpe.
Sempre peça provas para que você se certifique de que a pessoa está dizendo a verdade.
Uma opção é participar de um bate-papo com câmera em tempo real para ter certeza de que aquela pessoa de fato existe, e que seu gênero e idade são de fato o que a pessoa disse. Telefones fixos do local de trabalho e da residência também são bons indícios.
É normal temer quando uma informação pessoal nos é solicitada, então coloque cada situação na balança, claro que uma videoconferência não irá apresentar nenhum risco, então se a pessoa se recusar, é motivo para desconfiar de que talvez ela esteja mentindo.
Quando mentir é crime – calúnia
Calúnia, segundo o Código Penal, é imputar falsamente a alguém um fato definido como crime (art. 138). Esta situação acontece mais vezes do que imaginamos nas redes sociais, desde acusar alguém de roubo, até agressão e estupro.
Nesta situação, existe um agravante: quem propaga ou divulga a calúnia contra o indivíduo, também está cometendo um crime e é possível que a mesma penalidade seja aplicada.
Alguns indivíduos, num ímpeto emocional de vingança, podem ficar confortáveis seguros para criar mentiras sobre determinadas pessoas, usando o anonimato. Nesses casos, além de falsidade ideológica, este indivíduo estará caluniando, o que é considerado um crime e, acredite, é possível identificar de onde partiram as denúncias mentirosas.
Este tipo de crime atinge diretamente a honra e o moral das pessoas, apesar de ser difícil evitar, já que parte da atitude de terceiros, a vítima deve procurar um advogado para se orientar quanto as medidas a serem tomadas nesta situação.
Comunicação Falsa de Crime
Denunciação caluniosa é quando o sistema de procedimentos de investigação criminal e processo penal (polícia, delegacia, Ministério Público e etc.) é ativado de forma indevida, fazendo com que caia sobre alguém uma investigação ou processo sobre um fato que não ocorreu ou não foi praticado. (Art. 339 do Código Penal).
Em se tratando da internet isso pode parecer meio confuso ou até impossível de acontecer, mas não é assim que funciona. Alguns órgãos, como Safernet, Ministério Público e até a Polícia Federal podem ser acionados na internet, por meio de sites e redes sociais.
Um exemplo de como agir, é se caso alguém, de forma maldosa, acusa a outra de compartilhar conteúdo criminoso, levando o caso à Safernet, por exemplo.
Alguns órgãos aceitam denúncias por meio de redes sociais ou digitais, como e-mail. A pessoa será investigada, ainda que esta seja uma vítima e a investigação não seja merecida, por ser inverdade ou porque o crime não foi cometido por ela.
Quando a ação policial ou judicial não é efetiva, apenas a comunicação do fato, então passa a ser considerada comunicação falsa de crime ou contravenção (Art. 340 do Código Penal), o famoso “trote”. Se a comunicação falsa for cometida de modo anônimo, há considerável aumento na pena.
Pior do que a calúnia, esses tipos de crime abrangem toda a máquina do Estado, desviando a atenção de situações corretas e realmente sérias, colocando em foco um fato falso e mentiroso.
Seja na internet ou fora dela, todas as nossas ações têm consequências. Nem sempre uma “mentirinha” é boba podendo, inclusive, se transformar em crime.
Nossas emoções, muitas vezes, podem nos fazer cometer erros dos quais posteriormente nos arrependamos. Os motivos são diversos, portanto é imprescindível que você meça suas atitudes e suas palavras para não cometer um crime.